Imolou-se revoltado por ser vítima de furto

José Faria, 70 anos, andava transtornado por lhe terem furtado e vandalizado o carro. Ontem saiu de casa bem cedo e, durante a manhã, ainda telefonou aos filhos e aos netos mais velhos antes de estacionar outra viatura na área de descanso de Fátima da Auto-estrada do Norte (A1). Aí, num acto de desespero, regou-se com gasolina, ateou-a com um isqueiro e morreu carbonizado.

Os bombeiros recolhem o corpo de José Faria, que se imolou na área de descanso da A1

O corpo foi encontrado numa zona de estacionamento, junto às casas de banho, pelo genro, Carlos Lopes, a única pessoa a quem o idoso aceitou dizer onde estava. "Eu vim logo para cá, mas não cheguei a tempo de o salvar. Ele já devia ter tudo preparado", disse Carlos Lopes ao CM, adiantando que deixou uma carta (recolhida pela PJ) endereçada aos filhos no Opel Corsa que conduzia, estacionado nas proximidades.

Carlos Lopes não encontra explicação para o acto de desespero do sogro, mas um outro familiar adiantou que José Faria andava "muito transtornado" desde que lhe furtaram o carro, encontrado passados alguns dias vandalizado, com os pneus cortados e areia no motor. O facto de a mulher ser "muito doente" era outra "preocupação constante".

Há três anos, na sequência de problemas financeiros, José Faria ingeriu uma quantidade anormal de comprimidos, mas agora "andava bem", conta o genro, adiantando que, na segunda-feira, esteve a conversar com ele, não notando "nada de estranho". "O meu sogro era uma pessoa fechada. Não costumava contar os seus problemas, mas gostava muito de conversar com os netos", relatou.

SENTOU-SE NA BEIRA DO LANCIL E DEIXOU-SE CAIR

Depois de regar o corpo com gasolina, José Faria sentou-se na ponta de um lancil e acendeu o isqueiro, deixando-se cair para trás. Foi nesta posição que o corpo foi encontrado, tendo junto de si uma pequena lata de cor vermelha, que seria do combustível, e uma caixa de comprimidos. Apenas a zona ocupada pelo corpo estava queimada. Alertado para o que estava a acontecer, pelo genro do idoso, o destacamento de Trânsito de Santarém da GNR ainda enviou para o local uma patrulha, que chegou "cinco a seis minutos depois", mas já encontrou o corpo carbonizado. Dadas as circunstâncias, foi alertada a Polícia Judiciária de Leiria, que durante a tarde fez uma inspecção ao local, ao corpo e ao carro do idoso, recolhendo a lata de combustível e outros vestígios da ocorrência.

ESCREVEU UMA CARTA À FAMÍLIA

José Faria imolou-se depois das 12h15, mas entrou na A1 às 08h00, retirando na portagem de Leiria o respectivo ticket, que guardou no tablier do Opel Corsa cinzento. Seguiu em direcção a Sul e fez a primeira paragem cinco quilómetros depois, na área de serviço de Leiria, onde terá permanecido toda a manhã. Foi durante esse tempo que escreveu a carta endereçada aos filhos e lhes telefonou, despedindo-se e dando conta do seu desespero. Sempre que lhe perguntavam onde estava, desligava o telefone e só aceitou revelar a sua localização ao genro, após muita insistência. Ao final da manhã prosseguiu viagem, passou a saída para Fátima e parou na área de descanso, situada a 25 quilómetros de Leiria. O idoso não foi detectado, nem o carro, na ronda que o vigilante da área de descanso fez, pelas 10h30. A câmara de controlo de tráfego da Brisa também não captou a sua chegada, pois estava virada para a via, acompanhando o fluxo de tráfego.